Morada Nova : vaqueira que aposta na pecuária de leite

 






















Há 10 anos, a família Silva Macena,em Morada Nova, região do Baixo Jaguaribe cearense, começou com a pecuária leiteira depois de anos tentando sobreviver da cultura do feijão. A estiagem longa era um dos grandes desafios e uma peleja que fez a agricultora Francisca e o esposo pensarem em desistir várias vezes. Hoje, são fornecedores de leite pra uma das maiores empresas de laticínios do estado

 Tem coisas que só se conquistam se impondo, quase no grito, ou melhor, no aboio na hora de tanger o gado. Quando se trata de ser mulher então, no Nordeste, na área rural, tem que olhar atravessado mesmo, mostrar a que veio pra ter o respeito.

A vaqueira Francisca Jocilene da Silva Macena, 42, sabe bem como isso funciona e lutou muito para ser uma das produtoras de leite mais procuradas por empresários do setor de laticínios e agregar qualidade ao seu produto.

Há 25 anos residindo no município de Morada Nova, a 169 quilômetros de Fortaleza, ela começou vendendo feijão na cidade, mas nunca dava pra pagar os trabalhadores com a comercialização da safra. “Um dia meu esposo foi vender o feijão na feira e na volta só conseguimos pagar um trabalhador. Aí eu decidi ir vender e ele teimava que não ia dá certo”, conta Jocilene.

– Por quanto a senhora dá esse feijão?, disse o comprador.

– Dá não dou, eu vendo!

– Ah, a senhora é estressada…

Passado alguns dias, o comentário da mulher “estressada” rodou a cidade. Quase um mês depois, feijão estocado no depósito, tomando dinheiro emprestado para pagar trabalhador, lá vai Jocilene de novo à feira.  “Ou vendo esse feijão ou jogo fora. Nessa época, o preço da saca tava subindo e algumas pessoas vendiam até por R$60 reais”, disse a vaqueira decidida.

– Por quanto a senhora me vende a saca do feijão ?

– R$ 150,00

– Eu compro por R$ 130,00

– Só vendo por R$ 150,00

Depois de levar a fama de estressada, Jocilene chegou em casa com os R$ 150,00, pôs o dinheiro em cima da mesa e disse que a partir dali não queria mais saber de feijão. “Vamos investir em vacaria”, terminou o dia dizendo.

Leite

A opção pela pecuária leiteira não tornou a vida da família mais fácil. Em 2008, com dois anos na atividade, começou comprando as bezerras, extraindo leite, vendendo cinco litros de leite e indo deixar a cerca de dois quilômetros da vacaria. Compraram outra vaca, chegando a 30 animais em 20 hectares de terra.

Nesse período, a família fez o primeiro empréstimo pelo Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) no valor de R$ 1 mil para aquisição de animais e melhorias na infraestrutura da vacaria.

Na foto acima, a produtora Jocilene Macena, o filho e o esposo ao seu lado, o diretor da Ematerce Itamar Lemos e o gerente local Elói Marques

 

“A gente não sabia de nada, não tinha retorno. Dava muita comida às vacas e alguns animais com problema de engorda. Foi quando veio o técnico e gerente local do escritório da Ematerce de Morada Nova Francisco Elói Marques Damasceno esclareceu tudo em relação ao manejo correto, uso adequado da ração“, explicou a agricultora.

Com a assistência técnica da Ematerce veio a orientação para uma ração balanceada usando sal mineral, usando ração concentrada, sorgo, definindo a quantidade de proteína. O que antes não passava de 55 litros de leite, atualmente chega a atingir os 300 litros leite/dia.

Atualmente, todos as fêmeas do rebanho são inseminadas, existe o equipamento pra refrigeração e o comprador vem pegar pelo menos três vezes na semana, além da ordenha mecânica e a plantação de sorgo para alimentação animal. “Também orientei a vender os garrotes e ficar apenas com as fêmeas para focar na produção do leite”, destaca Francisco Elói.

Com os cursos de empreendedorismo rural pelo Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) Negócio Certo pelo Sebrae (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), toda a família passou a se envolver na produção, da ordenha ao administrativo passando pela inseminação e controle do produto, tudo é gerenciado pelos quatro membros da família.

Empreendedorismo rural

“Meu filho estudou, fez cursos de inseminação, eu na parte de empreendedorismo rural e tudo que fazemos é combinado entre os quatro; se quer comprar alguma coisa e ver que não dá certo, espera mais um pouco e vice-versa”, explica Jocilene.

A produtora pretende também trabalhar com orgânicos e comercializar os produtos em feiras e mercados da região. Segundo ela, além da venda do leite, dá pra diversificar o investimento com o aproveitamento do soro derivado do queijo, que pode ser usado para alimentar os porcos. Ainda tem a possibilidade de investir na produção de ovos com a criação de galinha caipira. “Não quero deixar a agricultura, já tem nora, e quero crescer aqui, mostrando toda essa riqueza para os meus netos”, diz Jocilene emocionada.

Além da diversificação na produção para a próxima propriedade de 42 hectares, na localidade de Pacavira, Jocilene e a família já produzem sorgo para reserva alimentar animal e comercializa para outros produtores. Já são 90 toneladas armazenadas e prontas para o uso no período de estiagem. A silagem tornou-se alternativa produtiva e subsistência econômica.

Essa dinâmica no processo produtivo mostrou-se fundamental com a greve dos caminhoneiros no início de 2018 e com as poucas chuvas no começo do ano. “Mesmo com esses problemas, nós produzimos queijo, doce e não paramos de movimentar as vendas”, comemora Jocilene.

O filho da agricultora e vaqueira Talisson Macena, 19 anos, já planeja os estudos para a faculdade e continuar se especializando no setor da pecuária. Com o investimento em conhecimento,inovação e assistência técnica e extensão rural pela Ematerce, a propriedade da família Macena é uma experiência modelo de produção diversificada bem sucedida.

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